O livro é em si uma jornada, peço então que me acompanhe…
Suzano – SP, 03 de Junho de 2015, quarta-feira.
Caminhando rumo ao trabalho, me lembro que é quarta-feira, um dia de magia, dia de Wotan, de Mercúrio, penso como estão as coisas no geral e o que ainda preciso resolver, tem aquele livro de Hoodoo que ainda não terminei de ler, e a dificuldade de adaptar práticas de outros locais geográficos para o Brasil. Lembro dos Orixás (Orishas e Loa no livro que não terminei), Exu realmente me parece um cara bacana, talvez por ser uma divindade da comunicação, mensageiro e trapaceiro como Hermes, pioneiro e abridor de caminhos como Ganesha, provedor de conhecimento dos deuses como Toth. No trabalho ouço uma animada conversa de duas garotas sobre as semelhanças da religião delas, uma da Umbanda descubro, outra do Candomblé. Penso que tenho uma boa proximidade com a Umbanda Sagrada, preciso conhecer mais do Candomblé. Um garoto e uma garota se aproximam e conversam sobre livros, Percy Jackson, digo que li só o primeiro, termino a conversa e penso “por que não temos um Percy Jackson da cultura afro? Essa demonização da cultura africana é uma merda.”, esqueço e vou para casa.
Suzano – SP, 13 de Junho de 2015, sábado.
Em um café, vejo um cara com seus 29 anos, bem vestido, esta frio e garoando, ele entra no café com uma mulher, antes de se sentar ele guarda na mochila um livro de capa vermelha com uma mancha negra, sem óculos leio apenas a palavra “Mundos” em brancas letras garrafais e amigáveis, “deve ser interessante” penso, “afinal ele carregava na garoa”, meu capuccino de chocolate chega.
São Paulo – SP, 27 de Junho de 2015, sábado.
Edifício Nacional, Freak Out e Sarau dos Mistérios da Meia Noite. Me divirto, sento perto do Andrei com sua boina de Freak Out (ele usa para facilitar a indicação, normalmente com uma camisa do MF) e a Ira sorrindo e atentamente olhando um cara carismático, magrelo e de vestido que é o mestre de cerimônia do evento, o cara responsável pela Taberna Cultural. Ele pensa rápido para sair das saias justas que o povo, sem querer, mas de forma incontrolável o coloca, “tocado por Exu” penso, pela habilidade com a comunicação e as pessoas. Três garotas ajudam muito ele, uma baixa de cabelos pretos tirando fotos, “gostei da camisa xadrez vermelha” penso, sem lembrar que estou vestindo uma. Outra de óculos, loira, baixa e de tranças, e a terceira mais alta, de cabelos avermelhados curtos e olhos apertados, elas parecem envergonhadas em meio a tanta gente, e realmente, muita gente. Mais tarde a caminho do Freak Out na Augusta, converso com o magrelo carismático agora sem vestido. “Gente boa, esforçado e com objetivos futuros bem posicionados, cara que luta” penso sobre o magrelo, e me surpreendo ao ir embora mais cedo, ao presentear a mesa com um pequeno papel com um símbolo para abençoar os contatos, relacionamentos, desenvolver a conversa e abrir portas, o magrelo reconheceu o simbolo, o Veve de Papa Legba, responsável por ser o intermediário e mensageiro entre os mortais e os Loa do Voodoo, assim como Exu é para os Orixás. Pego o contato de uma garota.
Suzano-SP, 29 de Junho de 2015, quarta-feira.
Em um café, lendo e conversando via Whatsapp com a garota que peguei o contato dias antes, sobre filosofia, e gostos pessoais, falamos sobre Mitologia Africana.
Pesquiso na internet a sinopse oficial:
O segredo da história é entrelaçar dois mundos – São Paulo, onde vive um jornalista audacioso, doido para ascender nas redações e conquistar uma posição de destaque, investigando um grande escândalo empresarial e se envolvendo com colegas e chefes; e Orum, onde vivem os orixás, o mundo da rica mitologia africana, onde Orunmilá, o maior advinho de todos tem os seus poderes silenciados e tenta entender como recuperar sua capacidade de antever o futuro. Numa jornada que aos poucos vai revelando como é possível que os dois mundos tão distantes no tempo e no espaço se comuniquem, o leitor vai descobrindo os sentimentos mais fortes capazes de guiar pessoas e deuses. Irá Orunmilá com a ajuda de Exu, Ogum, Oxóssi, Oxum reencontrar seus poderes? Irá Newton Fernandes compreender a origem das estranhas coisas que passaram a lhe acontecer
Me interesso, mas não anotei, logo esqueço.
Suzano-SP, 01 de Julho de 2015, quarta-feira.
Casa, depois de sair do trabalho, chego e atualizo o feed de podcast do meu celular, desde o dia anterior há disponível um episódio do BTCast, podcast de Teologia Cristã, mais especificamente Protestante que acompanho, “afinal, é a minha ‘religião’ e preciso ser Adkhari nela”, o tema “Ciência da Religião em Romance“, a linha de estudo que sigo é Ciência da Religião, “vou ter uma aula agora” penso, quando o programa começa, descubro que é em grande parte uma entrevista com um escritor que resolveu escrever sua ficção sobre a mitologia Africana em uma série de três livros, o nome do escritor: P.J. Pereira, a série: Deuses de Dois Mundos, me lembro da conversa com a garota dias antes. Ouço a entrevista, percebo a grande pesquisa que P.J. precisou fazer para a sua obra, uma vez que mitologia africana é um pequeno tabu na nossa sociedade, como ele se sentiu fascinado pela narrativa nada maniqueísta, com deuses outrora homens que caminharam, amaram e acreditaram, sendo o melhor de si e por isso virando Orixás. Pesquiso novamente e sinto que já vi essas capas mais de uma vez, capas lindas aliás.
Suzano-SP, 08 de Julho de 2015, quarta-feira.
Antecedendo o feriado, olho meus e-books para ter algo legal para ler (e quem sabe resenhar para o Mundo Freak), quando uma conhecida capa amarela com um corvo dentado pula as minhas vistas, uma promoção, o livro físico mais barato em uma conhecida livraria cultural, minha curiosidade já alimentada e imediatista me leva a procurar o e-book – consequências de morar em uma área periférica – menos de $9, compro.
No mesmo dia consumo metade do livro, me delicio com uma narrativa simples, rápida, pontuada pelos fatos relevantes – uma característica valorizada depois de ler o Kerouac – a literatura não é panfletária, não pretende agradar adeptos de religiões de matriz afro, nem desagradar, discorre miticamente como se estivesse falando de mitologia grega ou romana, os personagens são humanos, discorrem sobre vícios e virtudes, as relações possuem mais de uma dimensão e mais de uma camada, mesmo que apenas os personagens mais corriqueiros sejam tridimensionalmente desenvolvidos… Exu e Oxum são fantásticos. Ogum então incrível. É descrita uma São Paulo que pouco visito, mas que observo curioso a muito tempo. Dois dias depois o livro esta terminado. Nem tudo o que me parecia de primeira vista é realmente o que pensei, o universo de Deuses de Dois Mundos, parece possuir mais ajustamento que justiça, e mesmo assim há um plano. A divindade anda nas ruas, senta nas sarjetas, come, cansa, se irrita, tem interesses e faz acordos, mas não é subjugada, é livre.
A narrativa, intercalando os contos no passado e os e-mails de Newton com Laroiê me lembraram muito a escrita de Condenada do Chuck Palahniuk – “preciso fazer uma resenha do Palahniuk para o Mundo Freak” penso – o que acabaram por acrescentar uma relação diferente ao texto, existe o dinamismo da história, mas também um senso de “ocorrência simultânea” ou “acompanhamento” por parte do leitor, passando a impressão de que existe sim um fio conector que liga toda a historia do livro, como se houvesse certos sentidos que não são perceptíveis aos mortais – da história – mas fossem acessíveis aos Orixás – e ao leitor.
“Preciso comprar o próximo” penso.
Suzano-SP, 11 de Julho de 2015, sábado.
Casa, resolvo escrever sobre o Deuses de Dois Mundos para o Mundo Freak, converso com um amigo sobre o livro e ele me pergunta como o conheci. “Agora que ele perguntou, foi uma jornada um pouco curiosa” penso.
Sucesso e Axé.